Mudança climática, emergência climática, crise climática. São muitas as formas de chamarmos as transformações nos padrões globais do clima e da temperatura ao longo dos últimos anos. Essas transformações podem ser naturais ou causadas por nós, seres humanos, mas desde o século XVIII, com a expansão da produção industrial, as atividades humanas têm sido a principal causa desse fenômeno, segundo cientistas renomados. Quem acompanha notícias de fontes profissionais e de credibilidade sabe que, quase todos os dias, podemos perceber eventos, em diferentes partes do planeta, que sinalizam transformações aceleradas em nosso mundo, e que o clima vem sendo modificado. Para desacelerar esse processo, especialistas apontam que hábitos de consumo, transporte, alimentação, muita coisa precisa mudar.
Os efeitos das mudanças climáticas e a influência humana sobre o clima são estudados e comprovados pela ciência há várias décadas. Esses estudos são reunidos, avaliados e disponibilizados pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas, o IPCC, para toda a sociedade, para compreendermos os riscos associados às mudanças climáticas, seus possíveis impactos e nossas opções de adaptação e mitigação. Pesquisadores do último relatório já indicam que é preciso uma atuação coordenada e conjunta de boa parte da população mundial para não ultrapassarmos o cenário de aumento de 1,5℃ no fim deste século e cumprirmos o Acordo de Paris. É um desafio colossal, talvez o maior que a humanidade já presenciou em sua história.
Para lidar com a emergência climática, o multilateralismo e as forças democráticas devem ser prioridades em nosso país. O Brasil caminhará para uma democracia climática se sociedade civil, governos, empresas e agências multilaterais, como as da ONU, atuarem em conjunto, com tomadas de decisão relacionadas às mudanças climáticas sendo orientadas pela ciência em diálogo com conhecimentos ancestrais e tradicionais. As parcerias entre o poder público, comunidades e instituições serão estratégicas na construção de uma transição justa para um futuro bem-estar planetário, com investimentos nos países em desenvolvimento e pressão para implementação de políticas públicas eficazes de baixo carbono e, principalmente, sem injustiças sociais e ambientais.
Estamos vivendo os efeitos drásticos da emergência climática e a hora de agir é agora. É preciso engajar pessoas, sociedades, universidades, empresas, governos na construção do futuro que queremos. Alguns caminhos e alternativas estão em debate, na construção democrática sobre nosso futuro. Os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) capitaneados pela ONU e um conjunto de alternativas que emergem principalmente do Sul Global, incluindo as que colocam em questão o modelo de desenvolvimento econômico, podem conduzir a um bem-estar planetário que valorize a conservação da diversidade sociobiocultural, a erradicação da pobreza e uma vida digna, respeitando os limites do planeta.
Emergência climática e oceano
Aumento da temperatura e do nível do oceano, perda de biodiversidade e de serviços ecossistêmicos são apenas alguns dos muitos impactos esperados se continuarmos trilhando o mesmo caminho. Pesquisando em meu pós-doutorado para a criação da exposição “Futuros da Baía de Guanabara: inovação e democracia climática”, realizada pelo Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ, na Casa da Ciência, em 2023, aprofundamo-nos em um dos maiores efeitos do aumento da temperatura global: a transformação do oceano e destarte do litoral brasileiro e fluminense, onde se concentra boa parte da população do Estado do Rio. Afinal, os mares cobrem cerca de 70% do planeta e são fundamentais para a vida na Terra, fornecendo mais da metade do oxigênio que respiramos. Sua enorme biodiversidade é alimento, medicamento e renda para bilhões de pessoas que dependem dos recursos marinhos. Além disso, têm papel fundamental na regulação do clima global, absorvendo gás carbônico e calor da atmosfera.
As mudanças climáticas já causam consequências graves nesses ecossistemas e algumas delas são irreversíveis, como o derretimento de geleiras e o aumento do nível do mar. Mas a severidade dos impactos depende do quanto conseguimos diminuir nossas emissões de gases de efeito estufa e impedir que a temperatura aumente ainda mais. O Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas (IPCC) projeta, para até 2100, um aumento de temperatura global entre 2ºC a 4,5ºC. Com a elevação em 2ºC já podemos esperar diversos impactos nos mares como: o aumento da temperatura das águas, acelerando a multiplicação de microorganismos perigosos para a saúde humana; aumento da frequência e intensidade de furacões e tufões; acidificação dos oceanos, afetando animais, plantas e o equilíbrio dos ecossistemas marinhos. Os recifes de coral, por exemplo, podem diminuir em mais de 90%.
A situação se torna ainda mais grave se a temperatura subir em 3ºC, quando até 29% das espécies do planeta podem ser extintas. Um aumento em 4ºC teria impactos devastadores, com cidades inundadas, ilhas inabitáveis e expansão das zonas mortas marinhas. Os mares e o oceano estão se transformando rapidamente, mesmo com 2°C de aquecimento. No entanto, limitar o aquecimento a 2°C pode evitar muitos dos impactos que as altas temperaturas trariam, salvando vidas. Por isso, é urgente diminuirmos, como sociedade, nossas emissões de carbono.
Qual Rio de Janeiro queremos, agora e no futuro?
No Rio de Janeiro, a bacia da Baía de Guanabara, que banha também bairros onde a UFRJ se faz presente, simboliza um dos maiores desafios brasileiros, que vão desde conservar sua rica biodiversidade até a adaptação aos cenários de aumento do nível do oceano. Na exposição “Futuros da Baía de Guanabara”, abordamos possibilidades de futuro para o entorno da baía mais famosa do Brasil com base em pesquisas acadêmicas, e como podemos nos preparar e responder aos possíveis impactos sociais, econômicos e ambientais. Nela, entre os conteúdos desenvolvidos por mim em parceria com a pesquisadora Raquel Marques, apresentamos o filme imersivo “Futuros da Baía de Guanabara” que mostrou, em 360 graus, os desafios impostos pelas mudanças climáticas para o ambiente e a sociedade, com foco na Baía de Guanabara e seu entorno. Dividida em três salas, a exposição buscou provocar os visitantes a transformarem seu estilo de vida e a se engajarem em soluções diversas, em especial as que unam saberes científicos, populares e tradicionais e que sejam benéficas para todos.
Cientistas brasileiros, referências em suas áreas de pesquisa, integram o IPCC, o que demonstra a importância da valorização do conhecimento produzido pelos pesquisadores do país. Alguns desses especialistas são professores da UFRJ e colaboram no Painel em áreas diversas, seja realizando projeções de eventos extremos, analisando os impactos da mudança do clima nos ecossistemas e nas populações humanas ou até mesmo investigando opções de tecnologias sustentáveis. A UFRJ também hospeda o Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas, o par brasileiro do IPCC, que já liderou um dos estudos de projeção climática na Baía de Guanabara e em outras metrópoles costeiras do Brasil.
Além de obter e analisar dados e gerar informações, a comunidade científica também é responsável por comunicar o conhecimento científico para a sociedade e mostrar, aos tomadores de decisão, melhores práticas, isto é, aquelas que promovam desenvolvimento sustentável. Esse é um dos papéis da UFRJ no enfrentamento às mudanças climáticas. É na Universidade que acontece a busca de soluções e o desenvolvimento de tecnologias que serão capazes de auxiliar a sociedade a mudar o cenário climático, bem como planejar um futuro ambientalmente equilibrado, diverso e inclusivo para o Brasil e para o mundo.
Todas e todos têm um papel a cumprir. No mundo, bilhões de pessoas precisam estar conscientes do desafio real e de quais formas podemos nos engajar, cada um contribuindo de acordo com seu potencial e condições. Trazer vozes diversas e antes silenciadas para o debate e regenerar a complexa beleza do nosso planeta. Tanto iniciativas individuais quanto coletivas auxiliam no combate à emergência climática. Por isso é preciso união e engajamento — de governos, instituições públicas, privadas e organizações da sociedade civil — para enfrentarmos esse desafio. A ciência e a inovação produzidas nas universidades, aliadas aos saberes tradicionais, são ativos importantes para enfrentarmos a crise climática. Devemos, como sociedade, aprender a conservar os essenciais fluxos naturais que mantêm a nossa saúde e a dos ecossistemas, contribuindo também para futuros menos desiguais para cariocas, fluminenses e brasileiros.
- Leonardo Menezes
Doutor em Comunicação pela UFF, atua como curador de exposições, diretor artístico, audiovisual e roteirista. Curador de “Futuros da Baía de Guanabara – Inovação e Democracia Climática”, em 2023, na Casa da Ciência da UFRJ. Sua pesquisa acadêmica foca em exposições, divulgação científica, documentários, narrativas transmidiáticas, participação, edutainment e patrimônio audiovisual e museal.
Contato: leonardomenezes76@gmail.com